sábado, 7 de maio de 2016

Com quem vai se parecer o bebê que vem por aí?

Arquivo Pessoal
A formação do feto envolve a combinação de milhares de genes e as influências do ambiente, mas a criatividade dos pais cria rostinhos familiares antes mesmo do ultra-som

Lélia Chacon
Um dos passatempos prediletos de quem espera um bebê é ficar especulando sobre como será o herdeiro? Parte do mistério dá para resolver na gestação, quando o exame de ultra-som desvenda o sexo da criança. Mas sua menina virá com a covinha que o papai tem no queixo? Seu menino vai puxar os olhos da mamãe? Como serão o nariz, o formato do rosto, os pés, as mãozinhas? Será um bebê agitado ou tranqüilo? Tímido ou extrovertido? Bem, algumas das características mais evidentes dessa história talvez você possa perceber no nascimento, como orelhas grandes ou testa larga. Outras, um pouco mais tarde, como o jeito de sorrir. E mais tarde ainda os traços de personalidade e temperamento, que se estabelecem com o tempo. Para cada uma dessas características, no entanto, no mínimo um par de genes foi transmitido a seu filho: um seu, outro de seu marido. Metade terá vindo do óvulo, a outra metade do espermatozoide. Metades que também carregam genes de antepassados, dos pais, avós, bisavós. É o efeito total da combinação de todos esses genes que determina, no momento da concepção, a herança genética passada ao bebê. Mas carregar um gene não é garantia de que ele vá se expressar. Só é mesmo possível montar uma bolsa de apostas sobre o perfil do garotinho ou da garotinha que vem por aí. A ideia, aqui, é rechear essa brincadeira com informações que podem torná-la mais saborosa.

Milhões de células 
A transmissão hereditária é absurdamente sofisticada. Coisa para especialistas. Mas é possível compreender um pouco de genética, aquela que você aprendeu na escola. Que nosso corpo é formado por milhões de células e, em cada uma, temos uma cópia do ovo fertilizado, com 46 pares de cromossomos (23 do pai, 23 da mãe). Os cromossomos contêm todos os nossos genes, arranjados em unidades de ácido desoxirribonucleico — o famoso DNA. É essa estrutura, o DNA, que vai influenciar a aparência do seu bebê, a cor dos olhos, a textura dos cabelos, o formato do rosto, a estrutura dos ossos e muitas outras características. “Tudo resulta de bilhões de combinações para fazer um ser único. São cerca de 30 mil genes, em cada célula, envolvidos nessa construção”, diz o geneticista Décio Brunoni. Desses 30 mil, cerca de 10 mil participam da formação do cérebro, revela a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, autora do livro Cérebro Nosso de Cada Dia (Editora Vieira& Lent, 2002). “Parece muito, mas é pouco se pensarmos no nível de complexidade de uma estrutura que contém mais de uma centena de bilhões de neurônios capazes de mais de 10 trilhões de conexões para fazer um bebê sentar, engatinhar, aprender a andar, correr, falar, pensar. Isso tudo é definido com apenas 10 mil genes!”, maravilha-se Suzana. O curioso é que esses milhares de genes só são responsáveis por 50% da nossa capacidade cognitiva, aquela herdada geneticamente. Os outros 50% serão modulados pelo ambiente, as nossas experiências ao longo da vida. 

Em outras palavras, um gene sozinho não faz tudo. “A herança genética compreende a interação entre os genes e o ambiente, tanto o ambiente celular quanto o externo”, reforça a geneticista Célia P. Koiffmann. Significa que um mesmo gene pode estar na constituição da pele, do fígado ou do cérebro, mas atuará de modo diferente nesses ambientes. “Do mesmo modo, gêmeos podem ter igual fator genético para ser gordinhos, mas se criados de maneira diversa, com muita ou pouca oferta alimentar, um poderá ser gordo, o outro magrinho”, acrescenta a especialista. 

A herança genética, explica o geneticista Decio Brunoni, pode ser monogênica ou poligênica (multifatorial). No primeiro caso, um gene deu origem a uma característica. No segundo, diversos genes, além da influência ambiental, contribuem para uma característica. “A herança genética que permite a identificação da paternidade é única. O rosto de um bebê é uma herança poligênica. Às vezes, ele não se parece nem com a mãe nem com o pai, mas com alguém da família. Por isso, também, um casal de cabelos escuros pode ter um bebê de cabelos ruivos”, exemplifica. Todas as características quantitativas (peso, estatura, inteligência) são multifatoriais e sofrem grande influência do ambiente. “É por isso que jamais conseguiremos clonar um Pelé. O clone, para ser realmente igual, teria de repetir toda a história de vida desse nosso craque”, destaca Brunoni. 

A neurocientista Suzana lembra que compartilhamos 25% dos nossos genes com todos os seres vivos do planeta. “O gene humano tem 99% de semelhança com o gene dos chimpanzés. É também 95% parecido com o dos camundongos e 60% com o das galinhas”, diz. O que nos faz diferentes, claro, é o arranjo genético. Com qual ser vivo somos menos parecidos geneticamente? Os especialistas não souberam dizer, mas dá para imaginar que, provavelmente, os genes do seu bebê guardarão muito menos semelhança com os de uma vagem.

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