No choro da criança, uma oportunidade de aprendizado
Telma Vinha
Professora de Psicologia Educacional da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Mesmo sabendo que faz parte da infância, o choro das crianças sempre nos afeta de algum modo: pode nos mobilizar, angustiar, preocupar, irritar... Nessa fase, essa é uma das principais formas de comunicação dos pequenos e está presente nos conflitos, na dor, no incômodo e até diante de necessidades fisiológicas. Por vezes, basta um lanche ou soninho para a irritação passar.
Em torno dos 2 anos, a impulsividade e o choro aumentam. Isso ocorre porque, apesar de já entenderem o que ouvem, eles ainda não conseguem dizer o que pensam. Podemos ajudá-los descrevendo objetivamente o que eles demonstram querer. Momentos de estresse, como brigas na família ou a chegada de um irmão, também resultam em maior frequência e intensidade do chororô. Nesse caso, o melhor é minimizar a situação geradora - se possível - e ter muita paciência, dando ainda mais colo, atenção e aconchego.
Os pequenos têm muita dificuldade em controlar os impulsos, por isso choros, empurrões, gritos e mordidas são comuns. Ainda não conseguem lidar com desavenças nem se autorregular controlando a raiva. Outra característica é a incapacidade de perceber os sentimentos ou a perspectiva do outro, assim como de antecipar as consequências de suas ações. Isso fica evidente quando notamos a surpresa ou culpa de um menino por ter machucado o irmão, por exemplo, após ter atirado algo contra ele.
Entender o que há por trás desses comportamentos nos ajuda a atuar. As crianças estão no início de um processo de construção de estratégias para lidar com os conflitos interpessoais e as emoções, e precisam de intervenções construtivas do adulto para favorecer esse desenvolvimento.
Dessa forma, os choros presentes no cotidiano, que por vezes parecem tão perturbadores para nós, adultos, são também oportunidades valiosas de aprendizado para as crianças. Em vez de agirmos para evitá-los, com frases do tipo "Isso é motivo para chorar?", "Pare de fazer drama!" ou "Isso não é nada, é só um espinho", devemos aceitar os conflitos como parte natural e necessária do desenvolvimento infantil.
As intervenções mais eficientes são as que as ajudam a perceber seus sentimentos e os do outro, como: "O amigo pegou sua bola sem pedir e você ficou bravo. Depois que você se acalmar, vamos falar com ele", "Bater, dói. Nós conversamos, não se bate nos outros. Diga a ele que você ficou chateado", "Um espinho machuca. Vamos tirá-lo". Como mediador na resolução do conflito, o professor pode auxiliar os envolvidos descrevendo o problema sem tomar partido, incentivando-os a refletir sobre o ocorrido e a colocar o que pensam e sentem, e as propostas de solução.
Como as crianças até 4 anos, em média, têm dificuldades para identificar e expressar seus sentimentos, você pode "soprar" no ouvido frases que as auxiliem a dizer descritivamente o que aconteceu e o que elas sentiram, incentivando o uso de formas mais eficazes de se comunicar, como: "Diga que você não gostou quando ele pegou seu brinquedo. Que está bravo porque ele não pediu".
Na hora da birra, é importante evitar adjetivos ou apelidos como "chorona", "Ana Banana" e "João Bocão". A proposta é reconhecer e aceitar os sentimentos da criança, ajudando-a a manifestá-los de outra forma: "Você gritou com o colega, pois queria sentar na cadeira dele. Mas gritar não é um bom modo de conseguir as coisas. Melhor pedir de um jeito que ele consiga ouvir".
Não se trata, portanto, de conter ou ignorar o choro, mas de ajudar no desenvolvimento da autorregulação dos pequenos. Precisamos auxiliá-los na construção do equilíbrio emocional e na capacidade de enfrentar as dificuldades.
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