domingo, 19 de novembro de 2017

INDISCIPLINA NA ESCOLA? Saiba como lidar com esse problema!

indisciplina – um dos maiores obstáculos pedagógicos dos tempos atuais – transformou-se em um pesadelo para o professor. A maioria dos educadores não sabe como interpretar um ato de indisciplina. Deve compreendê-lo? Reprimi-lo? Ignorá-lo? Transformá-lo? Mais que uma infração ao regulamento interno ou um ataque às boas maneiras, a indisciplina na escola é a manifestação de um conflito e ninguém está protegido de situações desse tipo. Como é possível que a classe se desorganize tanto? Por que não se respeita mais o professor? Afinal, como pôr ordem no caos?
Esta obra – produzida por uma das maiores especialistas no assunto no mundo contemporâneo – desvenda as causas e indica remédios para prevenir e curar a indisciplina. Livro concebido e escrito especialmente para o público brasileiro pela professora Silvia Parrat-Dayan – hoje radicada na Suíça -, é leitura essencial para professores, educadores, orientadores, psicólogos, diretores de escola e demais profissionais envolvidos com a educação.



Os problemas de indisciplina manifestam-se com freqüência na escola, sendo um dos maiores obstáculos pedagógicos do nosso tempo. A maioria dos docentes não sabe como interpretar nem como enfrentar um ato de indisciplina. Deve compreendê-lo? Reprimi-lo? Ignorá-lo? Transformá-lo? 
E mais: como saber onde termina a indisciplina e onde começa a violência? Quais os limites da convivência social?
Yves de la Taille diz com razão que, se no começo do século passado era intrigante saber por que as crianças obedeciam, hoje seria mais adequado perguntar por que as crianças desobedecem.
Na escola há barulho. Escutamos o ruído de réguas, de cadernos e de lápis que caem, há vozes incessantes, alunos que se mexem nas suas carteiras, que vão de um lado para outro, que se xingam, brigam. Tem o aluno que dá o nome de um outro para fazer troça do professor, aquele que discute em voz alta, aquele que mastiga coisas, aquele que grita, aquele que fica em pé, aquele que gesticula. Não há limites. Indisciplina. Na escola, durante a aula, aumentam a incivilidade e a agressividade. Indisciplina. Há também os alunos difíceis, que contestam os trabalhos do professor, rejeitando-os por completo, e que não demonstram qualquer interesse pelo curso. Indisciplina. Para o docente, essa situação provoca desestabilidade e, às vezes, humilhação. Ela supõe uma espécie de indiferença em relação ao professor e isso é fonte de angústia para ele. Os alunos mostram-se desrespeitosos. A indisciplina é uma infração ao regulamento interno, é uma falta de civilidade e um ataque às boas maneiras. Mas, acima de tudo, a indisciplina é a manifestação de um conflito e ninguém está protegido de situações desse tipo. Essas dificuldades aparecem em todos os níveis de escolaridade.
Por que há indisciplina e violência na escola? De maneira geral, podemos dizer que o que hoje se exige como disciplina escolar não é a mesma coisa que tradicionalmente se pedia nos colégios. Por exemplo: ninguém pode exigir o silêncio total na sala de aula durante mais de cinco minutos. Segundo Prairat, não existe um nível de exigência pré-definido, e sim a exigência de construí-lo conjuntamente.
Em muitas situações, as regras precisam de redefinições para renegociar os limites do exigível, tanto em matéria de trabalho quanto de disciplina, o que é uma novidade no ambiente escolar. De maneira mais precisa, a natureza dos fenômenos de indisciplina mudaram. No barulho tradicional, a transgressão faz parte da interiorização da regra; no atual, a desordem é difusa e pouco ritualizada. A regra, no fundo, nem é conhecida. Prairat fala em barulho anômico, ou seja, os alunos são incapazes de se escutarem por causa das conversas cruzadas. As vozes dos alunos circulam em diferentes direções e a voz do professor integra este circuito de linhas cruzadas. Mas, ou o professor encontra alguma forma de deter o ruído, ou a aula vira uma desordem total!
Que seria de uma orquestra em que cada músico tocasse como bem entendesse? Se ela não tivesse qualquer disciplina? É difícil imaginar uma escola sem disciplina.
A disciplina consiste num dispositivo e num conjunto de regras de conduta destinadas a garantir diferentes atividades num lugar de ensino. A disciplina não é um conceito negativo; ela permite, autoriza, facilita, possibilita. A disciplina permite entrar na cultura da responsabilidade e compreender que as nossas ações têm conseqüências. Quem olha para a disciplina como algo negativo não entende o que é. Ser disciplinado não é obedecer cegamente; é colocar a si próprio regras de conduta em função de valores e objetivos que se quer alcançar. As características da disciplina e da indisciplina estão no capítulo “Como definir a indisciplina?”.
Hoje, fala-se muito em atos de indisciplina e, mais, ela é exposta e multiplicada graças a todos os meios de comunicação. Aponta-se o aluno que comete um ato indisciplinado. Mas por que temos alunos indisciplinados? As causas da indisciplina são múltiplas, como veremos no capítulo “As regras morais e o conceito de indisciplina”, e, muitas vezes, elas estão mais nos contextos que a produzem do que no indivíduo. Mas, como a indisciplina gera indisciplina, da mesma maneira que a violência gera violência, a indisciplina na escola pode expressar, na realidade, alguma coisa para além do desejo de perturbar ou de ser indisciplinado. Às vezes, ela representa a dificuldade do aluno para ser reconhecido; outras, é a expressão dos maus-tratos que recebe ou dos problemas familiares. Também pode ser expressão da crise econômica, das dívidas, do desemprego, dos pequenos espaços que, por desgraça, muitos têm por moradia. A violência que se produz dentro da escola é reflexo do que acontece na sociedade. Seja a violência social, como resultado do desemprego, do aumento da corrupção, da impunidade e da insegurança crescente; seja a violência familiar, que se manifesta no abandono, na separação, nos maus-tratos verbais e/ou físicos, na falta de espaço e, portanto, falta de intimidade; seja a violência midiática, que aparece nos seriados, filmes, novelas, games e notícias. Levemos em conta que os conceitos de violência e de indisciplina não têm o mesmo significado, mas é possível que da indisciplina se passe à violência. Em todo caso, a criança que faz barulho, provoca desordem ou, inclusive, comete atos de vandalismo poderia querer mostrar que existe.
Argumenta-se que foi a insistência na necessidade de respeitar os direitos das crianças na escola e em casa que provocou desordem e indisciplina. O problema não é o respeito que se deve à criança, e sim o medo que os adultos têm de estabelecer limites e regras, porque a autoridade é confundida com autoritarismo. A reclamação dos pais, dos professores e dos adultos em geral que assinalam que as crianças não têm limites é real. Os pais não os impõem, a escola não os ensina, a sociedade não os exige.
Sabemos que todo professor deve estar capacitado para atender, acompanhar e ajudar os alunos para que eles transitem pelas diferentes etapas das suas vidas. Para isso, precisam estabelecer os limites necessários, que permitam aos alunos canalizar todo o potencial que possuem em direção à construção de um projeto baseado na dignidade humana. Sabemos também que a tarefa de educar já começa na família e estabelecer limites cedo não é mau. Recordemos que o famoso dr. Spock havia escrito um livro de conselhos para pais no qual recomendava que se deixasse a criança fazer o que bem entendesse e, dez anos depois, o mesmo autor reviu suas posições e escreveu sobre a necessidade de estabelecer limites nas condutas infantis.
Na escola, que não é neutra, há regras contra a indisciplina. Se a escola melhorasse as possibilidades de reflexão, diálogo e participação, ajudaria a integrar os alunos, reforçando o sentimento de pertencerem ao grupo e à instituição.
Dar lugar à palavra como forma de laço social permitiria abrir um espaço de expressão. Falaremos dos remédios contra a indisciplina no capítulo “Os remédios contra a indisciplina: prevenir e curar”.
O problema da indisciplina na escola não é apenas um problema social, ele também questiona o professor. Como é possível que a classe se desorganize tanto? Por que não se respeita mais o professor? Como se fazer respeitar? Como manter a autoridade sem cair no autoritarismo? Como atenuar a indisciplina? Por que se vive em situação de conflito permanente? Como resolver o conflito?
O mal-estar na escola, o mal-estar na cultura, como diz Freud, é geral. Muitos são os professores que dizem: “Desse jeito não posso dar aula!” ou “Desde que os alunos me escutem…” ou ainda “Em educação, quando acaba o recreio?” E, na desorientação em que se encontram, perguntam-se: “E agora, o que devo fazer?”.
Como resolver esses problemas que questionam cada vez mais a identidade do professor? Como pôr ordem no caos?
O papel do professor merece um capítulo especial: “O professor hoje”.
A indisciplina é um problema mundial. Nos países mais pobres, as nuances amplificam-se. Além disso, cada professor tem uma visão diferente do que seja a disciplina. Para alguns, um caderno descuidado já é uma manifestação de indisciplina; para outros, apenas o silêncio total na sala de aula é sinal de disciplina. Uma professora menciona entre os problemas de disciplina a falta de pontualidade, os bocejos, o telefone celular que toca durante a aula e uma certa atitude prepotente em relação ao professor, que é tratado como se fosse mais um colega.
Deixando de lado a concepção particular de cada professor, da qual falaremos no capítulo “Os remédios contra a indisciplina: prevenir e curar”, a questão é que os docentes, em geral, se sentem pressionados e maltratados. O professor sente-se agredido pelos pais que reclamam, sente-se julgado pelos colegas e pelas autoridades da instituição, é testado pelos alunos e confrontado com um discurso negativo vindo de todas as fontes de informação. Ele não apenas tem que enfrentar os pais, os alunos, a pobreza e a falta de educação quando existentes, como também é perma­nen­temente desqualificado. Desqualificado pelos pais que reclamam quando ele dá nota baixa ou chama a atenção de um aluno, pelo diretor que pede para modificar a nota que atribuiu, e pela sociedade em geral. Como as crianças não vão se aproveitar dessa situação para conseguir o que querem?
Por outro lado, o professor sente que seu papel tradicional não dá conta da realidade atual, já que deve lutar contra dificuldades que nada têm a ver com aquilo para o que ele foi formado: a transmissão de conhecimentos e o ensino de conteúdos. Ele sente que tem de assumir responsabilidades que não correspondem ao que deveria ser o seu papel.
Diante de tanta dificuldade, deveríamos dizer que ensinar, no momento atual, seria uma missão impossível, como parece apontar o título de um debate realizado na Universidade de Genebra: Como pensar a educação quando tudo mudou?
É verdade que a tendência social é a de pedir à escola tudo e mais um pouco, e a de colocar o professor no centro de conselhos paradoxais. Por um lado existe a vontade de querer que os alunos tenham sucesso utilizando a competição entre eles; por outro, se desenvolvem objetivos educacionais que pretendem diminuir as disfunções da sociedade de consumo, como cursos de dietética para lutar contra a progressão de casos de obesidade. Ora, isso nada tem a ver com o tradicional aprendizado escolar. O risco desta tendência social é o de transformar a escola e seus professores nos responsáveis por tudo que vai mal.
Melhor e mais realista seria pensar a escola como o lugar da crítica social, o lugar onde se aprende a viver e a tomar distância da realidade para entender o que se passa. Por exemplo, em vez de se resignar à influência cotidiana da transmissão da violência através da televisão, os professores poderiam ensinar aos alunos, na escola, a linguagem desse meio de comunicação. Combater as desigualdades, a exclusão e todo tipo de dificuldade na comunicação é, por si só, todo um programa de ensino.
Por que não adquirir, na escola, condutas que permitam resolver os conflitos? A escola, que é um lugar de confronto, onde as crianças vão aprender e crescer, deveria prepará-las para quando elas tiverem que enfrentar os problemas da vida. Discorro sobre a importância do conflito no capítulo “Os remédios contra a indisciplina: prevenir e curar”.
Como não se questionar sobre o papel do professor? O que se espera dele? O professor tem que fazer o papel de mediador entre as crianças para que elas aprendam a conviver entre seus pares. Mas, além disso, ele depara-se até com a necessidade de ensinar as normas de conduta básicas, que deveriam vir da família. Nos textos teóricos exige-se do professor funções múltiplas, uma vez que, além do ensino, deve ocupar-se também da organização escolar, das relações com a comunidade, preocupar-se com os problemas afetivos dos alunos etc. Não se fala, hoje, da necessidade de o professor adquirir uma nova identidade? Não se fala na formação integral do professor? Retomaremos detalhadamente esse tema no capítulo “O professor hoje”.
Na realidade, o professor está sozinho e, com freqüência, é ele quem resolve durante a aula, sem intervenção de alguém que o ajude a confrontar o seu olhar com outros aspectos mais abrangentes da tarefa educativa, os diferentes problemas que se apresentam.
O ponto fraco – aquilo que o professor não conseguiu realizar – é o que a sociedade melhor percebe no seu trabalho. Ninguém valoriza nem respeita seus esforços. Pede-se para ele dar aula num ambiente onde a sanção desapareceu, onde os alunos têm que ser aprovados e onde já não mais se sabe o que é uma regra. Um professor argentino disse sentir um enorme peso sobre suas costas porque deve dar conta de tudo. A cada dia, no começo da aula, deve lutar com o mínimo indispensável, as crianças não trazem lápis nem caderno e esperam que o professor faça tudo. Ele tem de emprestar o material, apontar o lápis etc., para evitar os problemas de indisciplina. Essa situação gera mal-estar e cria tensões que causam indisciplina. Os alunos são bagunceiros e alguns desres­peitam o adulto. Então, o professor dá sua aula como pode e o grupo de alunos atentos é cada vez menor e, ainda assim, ele não poderá ter muitos alunos reprovados.
O professor recebe constantemente uma mensagem ambígua: exige-se dele que se ocupe da educação formativa e, ao mesmo tempo, exige-se dele que não seja muito rigoroso. Hoje, o professor exigente não é bem visto, nem na hora de ensinar nem na hora de avaliar.
Por outro lado, pede-se ao professor um constante esforço de adaptação: educandos, novos conteúdos, linguagens pedagógicas, tecnologias, funções, responsabilidades, sem dar sequer tempo para sua preparação, reciclagem e reflexão. E isso tudo sem ser respeitado pelos alunos, pelos pais, pelas autoridades e pela sociedade em geral.
Escuta-se freqüentemente relatos de docentes, sobretudo em países da América Latina, nos quais o diretor lhes sugeriu a aprovação de alunos que não tinham alcançado os conhecimentos mínimos, ou então, a aprovação do aluno que passa por um período de crise, como se a crise pudesse se resolver pela progressão continuada.
Muitos docentes não acreditam mais na educação como meio para a formação cidadã, para a integração social e para o respeito pela diversidade. Outros continuam lutando. O trabalho docente é uma das tarefas mais difíceis de se realizar, uma vez que implica a formação de cidadãos que pensem com amplidão de critérios e saibam fazer uma leitura inteligente das dificuldades do momento histórico em que vivem. Isto supõe poder analisar as dificuldades, imaginar estratégias de superação e viver num mundo melhor. Como pensar que é nas mãos do aluno de hoje, do qual a escola nada exige, que está o destino de todos? Se não adquire conhecimentos, quem vai construir a sociedade futura? Os professores perderam  sua autoridade, e os pais e os poderes institucionais, ao não res­peitarem os critérios do professor para avaliar os alunos, favorecem ainda mais essa perda.
As crianças nem chegam a ter referências e, portanto, não sabem onde procurá-las. Se o docente não é respeitado pelos pais do aluno, como vai chegar a ser uma figura reconhecida e com autoridade?
Há alguns anos, quando um aluno trazia uma nota ruim, os pais o questionavam, queriam saber o que ocorrera, saber se não havia estudado e por quê, saber o que não tinha entendido. Hoje, as coisas se apresentam de uma outra maneira. Não é a criança o objeto do questionamento mas sim o professor. Ele não ensinou direito e, portanto, é um professor ruim, e alguns pais, como aconteceu na Argentina em 2006, agridem diretamente o docente por ter dado uma nota baixa! Não há mais perguntas para saber o que se passou. Julgam-se as condutas fora de contexto, sem saber o que elas significam.
O professor, sem respaldo para exercer sua profissão, fica na defensiva perante o aluno. E, confrontado com atos de indisciplina e, às vezes, de violência, não sabe o que fazer porque não pode prever as conseqüências da sua própria conduta. Isso o leva a trabalhar com medo. Como trabalhar com medo? A profissão do professor, tão discutida na literatura atual, como veremos no capítulo “O professor hoje”, pode transformar-se numa atividade de alto risco? Que contradição!
Há alguns anos fala-se que estabelecer regras é atentar contra os direitos humanos e que seria o equivalente a reprimir. Toda forma de regulação do trabalho em sala de aula é interpretada como exercício de autoridade. Veremos no capítulo “As regras morais e o conceito de indisciplina” que essa é uma interpretação errada do que a Escola Nova propôs já nos anos 1920.
Se não houver regra, nem sanção, nem qualquer corretivo, os alunos se sentem poderosos e ao mesmo tempo perdidos, sem limites. Tudo vira bagunça, indisciplina. Por onde começar para restabelecer a ordem?
Oferecer aos alunos a possibilidade de participar no estabele­cimento de normas que sejam poucas e claras, oferecer a possibilidade de explicitar o que devem e o que não devem fazer e os procedimentos rápidos e eficazes para corrigir seu não-cumprimento seria uma alternativa para estabelecer a disciplina. É evidente que as regras devem ser reelaboradas constantemente. Outra alternativa é introduzir a figura do mediador, que pode ser desempenhada por um ou dois alunos escolhidos por seus companheiros ou por um adulto: professor, pai ou mãe. Falaremos das regras e da mediação escolar no capítulo “As regras morais e o conceito de indisciplina”.
Resumindo: o tema da indisciplina é complexo porque ela tem múltiplas causas, uma vez que articula várias dimensões. Além disso, assume formas diferentes em nossa sociedade atual, formas que não existiam em outras sociedades e em outros tempos. No começo do século xx, por exemplo, pensava-se que a indisciplina consistia em se posicionar contra as normas: uma desobediência insolente. Hoje, ela caracteriza-se por um desconhecimento das regras, o que leva a uma desorganização das relações. Em outras palavras: se antes o professor tinha alunos que não estavam de acordo com ele; hoje, tem alunos surdos. Na realidade, sempre houve brincadeiras, rebeldia juvenil e tendência a não querer trabalhar, mas, enquanto antes o professor estava respaldado, hoje é cada vez mais confrontado com condutas de pais e/ou figuras poderosas, como diretor de escola, que o desautorizam. O professor encontra-se à beira de um ataque de nervos, como diria o cineasta espanhol Pedro Almodóvar.
Da parte do professor, parece haver medo de pôr limites, de estabelecer regras claras e simples que possam ser cumpridas, assim, ser considerado autoritário. Dessa maneira, se antes os alunos podiam ser reféns dos professores, hoje acontece o inverso: docentes viraram reféns dos alunos, perdendo assim a autonomia e o respeito que merecem. Numa conferência pronunciada em Medelin, na Colômbia, em 2005, Juan Delval utilizou a expressão tirania dos alunos para falar nesse fenômeno.
Desafiar a autoridade é inerente ao desenvolvimento do ser humano, mas conhecer os limites da própria liberdade de ação também é. Se quisermos alunos capazes de pensar e atuar com critério próprio, com capacidade para tomar decisões livres e adequadas, é necessário reforçar a sua capacidade de autocontrole e auto-regulação. Na prática educativa deveria se potencializar a responsabilidade, a auto-estima e o esforço.
Porém, o desafio com que nos confrontamos agora é um novo autoritarismo exercido pelo grupo de alunos perante um indivíduo, o professor, e que pode levar a situações difíceis para um convívio adequado. São situações freqüentes dentro da sala de aula, que preocupam, com razão, os professores, uma vez que a conduta desafiadora dos alunos e a indisciplina em geral os afetam e podem chegar a situações violentas.
Quantas vezes não escutamos dos professores jovens, evocando suas primeiras horas de ensino, que eles esperavam que os alunos ficassem atentos às suas palavras! Mas o que perceberam foi o barulho ou os barulhos da sala de aula: ruídos imprevistos da queda de uma régua ou de um lápis, barulho de fundo de conversas entre alunos etc. É que os alunos reais são também muito diferentes daqueles imaginados pelo professor recém-chegado!
A turbulência, a agitação, a indisciplina dos alunos e a falta de autoridade do professor são problemas que aparecem antes de todos os outros para os não experientes. Porém, os mais experientes têm também esses problemas de indisciplina.
Perante uma turma turbulenta, a primeira ideia que ocorre ao professor é a da sanção escolar. Poderíamos nos perguntar se ela não seria artificial e se, no lugar de produzir o efeito desejado, quer dizer, o interesse pelo que está sendo ensinado, não provocaria exatamente o efeito contrário. O professor não teria que procurar melhor as razões do ruído provocado pelas condutas de indisciplina? Saber por que os alunos não querem trabalhar? Não teria que modificar sua atitude perante o trabalho escolar, fazendo com que o aluno seja mais responsável pelo próprio aprendizado? Qual seria, então, o remédio? A autonomia seria um fator de disciplina? Quando se trabalha com um método de castigos, o aluno só aprende para fugir deles e não por interesse pela matéria.
A indisciplina é um problema sério, ela não tem forma e segue diferentes caminhos: falar, jogar papeizinhos, não estudar, não escutar etc. O problema do professor é dar forma àquilo que não tem, direcionar a disciplina para alguma coisa que faça sentido, para algum objetivo, um projeto. Dessa forma, a indisciplina poderá se transformar em disciplina intelectual e moral.
Por onde começar, então? Talvez por fazer funcionar as regras que já existem e não se aplicam e, a partir daí, imaginar um outro funcionamento na sala de aula, como veremos no capítulo “As regras morais e o conceito de indisciplina”. Mas tentemos, antes disso, definir a indisciplina e diferenciá-la da violência.

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